No shopping center com C D A
uma vez que o Mercado Central fechou ao meio-dia, vou para
o shopping-center da avenida central
-sob a luz artificial, acossado por promoções, o que descrever?
tanto faz, pois todos os shopping-centers se parecem -
é o teu vulto, Carlos? - aquele que vejo ali no elevador
panorâmico?
cabisbaixo, calvo, contido, caminhando,
o relampejo dos óculos nas vitrines, onde as mercadorias
continuam à espreita?
é o teu corpo que segue na escada-rolante meio torto no mundo,
ainda gauche?
enganchado nas esteiras, tropeçando nos degraus dinâmicos?
pressa, pressa – Vamonos! Let's go! as promoções nos esperam!
o que desejam aquelas moças em flor? se casar? ganhar
um carro 0 Km?
se vão casar não é comigo … - o que desejam os jovens
exaltados
a disputar espaço e ofertas? alguma vez eles já abriram um
livro de poemas?
quem se importa se uma flor nasceu na praça de alimentação?
ali o poeta merencório avalia as compras
- qual o preço do abacate? - são confiáveis os morangos? -
quem admirará a flor no asfalto? quem suspirará por Fulana?
tua cabeça baixa meditando em pensamentos elevados
projeta-se, Carlos,
ainda vivemos o medo com 'flores amarelas e medrosas'
o medo de policial e de bandido o medo de bala perdida
o medo da autoridade e da falta de autoridade
nos refugiamos em shoppings de segurança máxima -
nossos úteros de ar condicionado -
o 'mundo caduco' é um mundo tecnocrata de máquinas humanas
e humanos autômatos
temos o 'sentimento do mundo' nas salas de chat nas lan houses
portais do mundo virtual
nosso tempo é ainda de 'homens partidos' e de muitos partidos,
com as Esquerda no poder tão burocratas quanto os Elitistas
das Direitas -
quem ainda tropeça na 'pedra no meio do caminho'? quem
ao menos lembra-se da pedra?
quem ainda 'luta com as palavras'? quem sabe o que são palavras
numa apoteose de imagens?
parece que a noite dissolve mesmo os homens, e os jovens
à saída das salas de cinema -
que os mortos ainda vestem sobrecasacas, que ainda tecemos
'especulações em torno da palavra homem' para distinguirmos
homem de clones e robôs,
sempre acalentando aquela 'falta que ama', nos namoros virtuais,
em nossas 'oficinas irritadas' a conservar 'lembranças do mundo antigo',
ainda nos arquivos de fotos digitais,
a minha frente o vulto do poeta lembra-me fotografias antigas...
os vultos dos poetas lembram-me mundos antigos...
ah, Carlos, quão difícil ser amigo dos poetas! quando jovens
os poetas são egocêntricos e arrogantes, e os poetas envelhecem!,
quando velhos os poetas são amargurados e ensimesmados –
ah, os poetas!
será que o destino dos poetas é se tornarem sarneys?
prêmios nobels da caretice e da falta de diálogo?
ah, se os poetas não tivessem idade, se não tivessem...
-não estás mais aqui, e vulto não é tu, mas conversemos ainda
sob as câmeras livremente …
(inspirado livremente 'No Parque Ibirapuera' [ Roberto Piva] inspirado em
'Supermarket in California' [ Allen Ginsberg ] )
18/19jun11
Leonardo de Magalhaens
LdeM
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