quarta-feira, 4 de abril de 2012

Entrevista com o filósofo Rodrigo Starling (parte 1)


 
Entrevista Pão e Poesia

com o filósofo Rodrigo Starling


autor do livro “2050 – Voluntariado e Sustentabilidade”

março 2012, em Belo Horizonte / MG


temas: Terceiro Setor – Voluntariado – Ecologia

Parte 1

! Buenos días! Buenas tardes ! Buenas noches!

Estamos aqui para mais uma entrevista Pão e Poesia com o poeta, filósofo, e agora consultor, Rodrigo Starling que montou uma empresa, a Starling Consultores. Estamos entre o bairro Glória e o Alípio de Melo, e vamos falar sobre o novo livro, a nova obra do Rodrigo Starling, que nós conhecemos como organizador de eventos, poeta, escritor, pensador, e agora trabalhando com questões mais sérias: o futuro deste planetinha chamado Terra. Este livro foi traduzido para o inglês, como podem ver. E aqui está o autor em pessoa, para comentar. Rodrigo...

RS : Saudações, meu caro Leonardo de Magalhaens, companheiro de tantos projetos culturais, sociais... ambientais...

LdeM: Tutto bene? Vamos falar sobre... Você que é conhecido pela obra de poesia, organizou eventos da OPA!, shows de rock em homenagens ao pessoal do Pink Floyd... etc, etc

RS: … homenagem ao Syd Barrett...

LdeM: Pois é, podemos fazer uma lista …. E agora estamos descobrindo um novo Rodrigo Starling que é o pensador sobre ecologia, que atua em eventos, em congressos... Você poderia falar sobre esse novo trabalho seu com voluntariado, e sobre como você idealizou e escreveu este livro “2050 “ que está traduzido para o inglês.

RS: Bom. Começar a falar do voluntariado na minha vida, o que é uma coisa extremamente interessante. Se formos pensar, Voluntários todos nós somos. Somos voluntários no sentido de que nós estamos 24 horas fazendo as atividades primeiras, as quais escolhemos profissionalmente, ou socialmente, e em alguns momentos, nós, voluntariamente, escolhemos fazer outras coisas. Ou seja, você é médico, tem aquela profissão, mas você tem outras atividades que compõem o existir, o estar mundo, sua vida social. O voluntariado que tem uma questão técnica, mas tem também uma questão mais prática, que é uma virada de olhar, além daquelas atividades primeiras.

Então o voluntariado na minha vida começa muito cedo, porque como todo jovem, há alguns anos atrás, na fase dos quinze , dezesseis, dezessete, eu tive aquele pequeno desejo de todo homem costuma ter quando jovem, de 'mudar o mundo', e eu me coloquei a praticar este exercício de mudar o mundo. E comecei a me envolver com o Terceiro Setor.

Terceiro Setor é tudo aquilo, falando de uma forma bem prática, objetiva, é tudo aquilo que não se configura como Estado, o primeiro setor, o governo, seja nas esferas federal, estadual, municipal, e tudo aquilo que não é empresa, que não nasce única e exclusivamente para gerar lucro . Então Terceiro Setor são as ONGs, as associações e as fundações que geralmente trazem um objetivo mais social, de resolver alguma causa, algum problema, que eles entendem que o Estado e as empresas são deficientes nesta resolução. Este é o chamado Terceiro Setor.

Então voluntariamente, desde o ano de 2001, eu venho trabalhando em associações de bairro, depois trabalhei em DAs de filosofia , os diretórios acadêmicos, da PUC, pois sou formado, graduado, em Filosofia. Ali naqueles corredores, que mais pareciam os jardins de Epicuro, onde as ideias transitavam livremente, a gente teve oportunidade de se unir com algumas pessoas, que a sociedade costuma chamar de loucos, ou idealistas, nós fundamos uma organização, e aí começa a [minha] trajetória no Terceiro Setor, onde agora trabalho profissionalmente. E [a organização] se chamava OPIO.

E o que é o OPIO? Karl Marx dizia que 'a religião é o ópio do povo', é uma frase muitas vezes dita fora do contexto, mas a gente queria brincar com esta frase de Marx ( um cara muito sério, mas às vezes não levado tão a sério; mas sério, com bons pensamentos, bons propósitos), que era entorpecer as pessoas de cultura. Então, se a televisão, o mainstream, os grandes canais, grandes detentores da mídia, das questões sociais de impacto, trabalhava com mídia agressiva, valorizando a questão da prostituição, músicas com letras péssimas, etc, e nós tivemos a ideia de fazer o OPIO que era entorpecer as pessoas com cultura.

E assim fizemos. Começamos a nos reunir nos jardins internos da PUC Minas , no Coração Eucarístico, Belo Horizonte, e lá nós sentávamos debaixo das paineiras, no horário de dezoito horas, quando os estudantes estavam rumando para as suas salas, e estando ali sentados, reunido aquele grupo de pessoas em círculo, no meio das buchas de algodão e muitas pessoas se interessavam, achavam diferente, e perguntavam 'O que é isso?', e nós respondíamos 'Isto é a OPIO – 'Oficina de Produção Independente Organizada', nosso propósito é trabalhar [como] um coletivo de artistas – que sempre mudaram o mundo, as artes e as letras mudam o mundo, apesar de serem mudanças demoradas.

Então nos queríamos fazer, meditar neste tipo de coisa, mas com uma visão do artista empreendedor, nos coletivos, nas universidades, mas principalmente envolvendo mentes. Queríamos trazer mentes pensantes, grandes personalidades, no sentido de produção literária, de pensamento, de questionamento das estruturas sociais para trabalhar conosco.

Isto foi no ano de 2003, e, depois de diversas reuniões, nós fundamos, em 2004, a Oficina de Produção Independente Organizada, que, depois, por uma série de fatores passamos a chamar de OPA! Porque o OPIO, como todo mundo sabe, é uma substância entorpecente retirada das sementes de papoula – e com toda licença poética, que nos permitiu batizar a Ong desta forma, nem sempre isto é compreendido pela sociedade, então resolvemos passar para OPA! Simplesmente Oficina de Produção Artística, e começamos a nossa caminha rumo ao Terceiro Setor.

Bom, eu vou acelerar um pouco, nesta caminhada, porque a gente tem que falar em termos de fases, para não alongar muito. Mas, logo após a OPA, que era uma ong essencialmente cultural, eu conheci a VIDES, que é uma sigla italiana de Voluntariado Internazionale Donna Educazione Sviluppo, é o Voluntariado Internacional para o Desenvolvimento, Educação e Promoção da Mulher, é uma ong italiana, nascida em 1987 em Roma, está presente hoje em 40 países. Então eu recebi um convite de um antigo professor, Douglas, ao qual sou muito grato, sabendo que eu já mexia com a OPA, com outras pessoas do Terceiro Setor, que eu me envolvesse com questões do voluntariado. Era uma ong essencialmente que não apenas usava do voluntariado para algum trabalho, mas o seu trabalho era formar voluntários, a ong existia para formar voluntários, que eles fossem críticos e atuassem na sociedade de forma ativa, positiva e efetiva.

Eu falei: 'Me encontrei ! É isto que eu quero!' A Arte vai me ajudar, a filosofia vai me dr um lastro importante de diferenciação, nestas negociações da retórica, da linguagem. A linguagem abre muitas portas ou fecha. E vi ali uma grande oportunidade. Mas confesso, aos senhores, que o voluntariado para mim ainda era uma coisa estranha e era muito ligada ao assistencialismo, eu tive uma visão do voluntariado como uma coisa assim muito caridosa, como se fosse apenas doar cestas básicas, ajudar os velhinhos, agasalhar as senhoras, e não, então nesta organização tive a oportunidade de perceber que não.

E me envolvi bastante nestas questões de temas sociais, até mesmo porque a organização tinha pilares teóricos que me interessavam, por exemplo, Paulo Freire, “Pedagogia do Oprimido”, com metodologias interessantes, para trabalhar com o povo, a sociedade de base, mas para que ele se empodere e consigam efetivar mudanças sociais expressivas, com a construção de políticas públicas, coisas do gênero. Então entrei nesta organização exatamente em 10 de abril de 2006, e vocês me permitirem eu serei bem breve aqui...

LdeM: Você chegou a organizar congressos para eles, não? [RS: Sim, vários.]Como é, na prática, o voluntariado?

RS: A minha função na organização primeiro foi como secretário, em 2006. Secretário que tinha uma função diferenciada. Assim como Maquiavel era secretário da chancelaria no Palácio Vecchio, na época dos estados papais, não tinha um cargo de expressão, mas era quem conduzia as grandes negociações entre os parceiros, etc, guardadas as proporções, eu também fazia esta função de secretário de chanceler, cuidando das questões ligadas à estratégia, ou seja, parcerias com empresas, captação de recursos, troca de informações, angariamento de novos associados, coisas do gênero.

Mas como eu sempre fui interessado nestas coisas, eu tinha o desejo de caminhar mais, de que nossa organização podia efetivamente influenciar nas políticas públicas, de impacto na sociedade, mas podia dar uma nova leitura ao voluntariado no Brasil. Para vocês terem uma ideia, o Brasil é considerado, por todas as pesquisas, um dos países mais solidários do mundo, haja visto as enchentes e problemas que temos. O brasileiro é muito solidário, o volume de doações é muito grande e, ao mesmo tempo, [tem] as piores legislações sobre voluntariado no mundo! Então existe aí um grande abismo. A teoria que fala do voluntariado e a prática em termos jurídicos.

Entendemos também que o Brasil ainda carece de um voluntariado, que vou chamar de transformador, porque optamos por uma tradição até - nada contra a caridade em si, mas uma tradição que vem das santas casas de misericórdia, que chegaram ao Brasil em 1943, em São Paulo, que era um voluntariado da prática mesmo, doação de cestas básicas [...]

LdeM : Filantropia, no caso...

RS: Filantropia. E agora a gente precisa, não é uma questão de escolha mas de necessidade, transitar para um voluntariado, que chamamos de transformador. Ou seja, os grupos que fazem as ações, se transformam em coletivos. Você transita também da questão do assistencialismo para a promoção humana, então uma questão de ''empowerment”, do inglês que traduzimos como 'empoderamento', você não chega nas comunidades e dá as coisas. Você 'empodera', você cria, forma lideranças, para que estas lideranças possam replicar isto, e o povo possa exercer seus direitos...

LdeM: Ou seja, é a autonomia, não a filantropia. Mas autonomia.


Continua...


transcrição by LdeM

http://leoleituraescrita.blogspot.com

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário