quinta-feira, 7 de abril de 2016

2 poemas de ALEXEI BUENO




ALEXEI BUENO



OS RESTOS


Tudo retornará, tenho certeza, um dia,
Tudo ressurgirá na nossa alma inocente -
A mãe que nos levava, a face fugidia,
Os pés brilhando a um sol há tantos sóis ausente.

Depois, em cada noite, um manto astral silente,
A porta, única e exata, onde nossa ânsia urgia,
Nossa amiga vergonha, a outra esquiva, a Alegria,
E a Dor, na íntima rua, e a Náusea, hedionda e doente.

Mais os velhos de então... Sim, nada acabará,
Dedais, restos de feira, as bocas desmentidas,
Nossas cismas banais, nossa sorte tão má...

Cada som, cada cisco, a mais sonhada hora,
Tudo outra vez virá, mas mesmo entre essas vidas
A arder, nós nos voltando havemos de ir embora.



14 - 5 -1992




em Lucernário / 1993


...






ALEXEI BUENO



ESPÓLIO


No fim de tudo, quando os adorados
Membros forem torrões no pó incristados,
Quando os móveis tiverem, muito antigos,
Dado ceia aos cupins, fogo aos mendigos,
Quando os papeis rolarem já nas poças
E o chão pisarem nem nascidas moças,
Quando outras gerações, sem nome nosso,
Olharem para o céu sempre em esboço,
E os restos nossos, sem que a vida atine,
Dormirem num promíscuo de vitrine,
Sem um vínculo mais, um gesto, um preço,
Sem mesmo as casas, sem seu endereço
Também mudado já, sem um resquício
Do nosso rude amor, nosso suplício,
Então só sobrarão, no tempo emersos,
Uns versos, como agora, uns rijos versos.



5-6-1992




em Lucernário / 1993


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