Drica BH, Anome, 2013
Tácito
Naves Sanglard
LEMBRETES
-
Desconstruir, tijolo a tijolo
a poesia produzida,
mesmo que arada e adubada
esteja essa terra fértil e falsa
de sonhos e pesares.
- Abortar, ainda que o sol a sol
intente histórias pra contar,
planos extirpados anteriormente,
ou que sejam futuros
de lugar algum, ou de
algum lugar que seja,
sem mais cuidado,
ou dor aparente.
- Amortecer, com rigor,
os desejos secretos,
por serem fabricados e falsos,
ainda que criados com a
ilusão de verdadeiros.
- Digerir, a tarefa ingrata
que se lança, e conter o
verso compulsivo,
que derradeiro testa
a ausência de texto e forma
adequada, além de fatos que
norteiem a correção do rumo
imaginário.
- Importante: exterminar um por um
os personagens:
o enredo, o cenário,
as lembranças,
o poeta.
a poesia produzida,
mesmo que arada e adubada
esteja essa terra fértil e falsa
de sonhos e pesares.
- Abortar, ainda que o sol a sol
intente histórias pra contar,
planos extirpados anteriormente,
ou que sejam futuros
de lugar algum, ou de
algum lugar que seja,
sem mais cuidado,
ou dor aparente.
- Amortecer, com rigor,
os desejos secretos,
por serem fabricados e falsos,
ainda que criados com a
ilusão de verdadeiros.
- Digerir, a tarefa ingrata
que se lança, e conter o
verso compulsivo,
que derradeiro testa
a ausência de texto e forma
adequada, além de fatos que
norteiem a correção do rumo
imaginário.
- Importante: exterminar um por um
os personagens:
o enredo, o cenário,
as lembranças,
o poeta.
...
Compulsivo
Todas
as noites eu
teço
um fio novo,
fino
e longo
que
vou enrolando
até
o amanhecer,
e
apenas interrompo,
quando
sou eventualmente
podado
por um enfermeiro maluco,
que
parece não entender bem
a
importância do fato.
Eu
conheço bem a finalidade do ato
e
julgo compulsivamente
que
existe uma ciência e
um
porque na feitura da obra,
e
creio ser meu dever sagrado
relatar
a ele de imediato,
os
avanços que faço,
mesmo
que ele não entenda,
e
seja profundo e tristemente
ingrato.
Os
dedos longos e
carnudos
que eram,
são
apenas ossos endurecidos que
não
respondem o movimento,
o
comando, e muito
menos
o tato.
Vez
por outra
vários
nós se desatam,
sem
maiores consequências,
mas
não me importo,
e
refaço pacientemente o ornato,
desde
o início novamente,
até
que involuntariamente
provoque
um novo desbarato.
Aí
me distraio um pouco
olhando
para o retrato de
um
gato inexistente
que
me fita da janela,
como
que por loucura,
mas
lhe sou grato,
pois
repenso e reprogramo
todo
o meu trabalho.
Todos
os dias, eu teço um fio
novo,
fino e longo...
e
esta é uma opção,
e
este é o meu destino.
…
Teatros
da Vida
Não
dá para saber
o
papel que desempenhas,
ou
que teremos,
no
teatro da vida,
ou
o que serás amanhã.
Quisera
eu ter prazo para
o
ensaio geral,
para
te ensinar e para aprender,
e
pra temporada inteira,
como
proceder,
como
se portar em cena,
como
simular o beijo
verdadeiro,
que pretensamente
falso,
praticamos,
mesmo
sabendo que tu sabes
pouco
desse jogo teatral,
que
às vezes pode ser cruel
mas
nunca falso.
Apenas
uma encenação
que
a vida imita.
Mas
hoje ainda não é
o
ensaio geral,
e
teremos amanhã e depois
para
treinarmos
alguns
passos,
alguns
abraços
ligeiros,
e
cenas que não são
tanto
a meia luz,
como
praticamos.
É
o que temos, minha
vida,
neste curto
tempo
de preparo
de
uma sexta feira,
sabendo
que a estreia
inexorável
será em
todos
os dias da nossa vida,
com
o mesmo frisson
e
enquanto fizermos sucesso.
E
é neste palco,
é
lá que iremos viver
a
vida que ensaiamos,
e
nela temos tudo pra nos amar,
exatamente
como atuamos,
como
personagens
dos
tempos de preparo,
que
treinamos tanto,
para
aplausos receber.
…
Tempos
e Tempos
Esses
são tempos de classificar e definir.
De
pegar e refletir sobre o que te faz bem
e
devolver ao mar aquilo que está vencido.
Revistas
velhas, retratos amarelados
e
sem sentido, pessoas não identificadas,
caixas
que nunca abriu, velhos baús cheios
de
quase nada, e cantos da sua casa,
onde
já se refugiou um dia
e
sabes muito bem porque.
Hora
de deixar ventilar o coração, antes que
ele
emperre de vez e nunca mais se abra.
Hora
de jogar no lixo, o lixo que guardastes
com
apego, achando que novamente ele
virasse
um livro de ouro, igual ao que fizestes
no
colégio, com assinatura de todos
que
te amavam, e eram tantos e era todo
esse
momento guardado intocável
no
seu peito, hora de refletir e se lançar
no
caminho das ondas mornas e percebíveis
que
alegram a sua alma.
Hora
de se tirar o bolso, um restinho do mofo
que
se formou no tempo, e entrar em mar aberto,
com
a alma pura, e no peito, um turbilhão de coragem,
prestes
a explodir.
…
Carona
Sinto
a necessidade
insuportável
de
escrever versos,
como
se eles
pairassem
no ar
na
minha frente
e
me tentassem
com
gestos eróticos,
posições
mundanas,
balançando
as
claves
de maneira obscena,
simulando
arpejos,
fazendo
agudos
parecerem
graves,
como
se musical fosse
o
meu dom,
e
mal lido com as palavras,
letras
frágeis,
apenas
sentimentos podem
reger
o mundo,
e
o amor por uma pessoa,
eu
apenas pego carona
e
vivo deles !
In
Drica / 2013
Tácito
Nave Sanglard
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