terça-feira, 14 de abril de 2015

Eduardo Galeano - Patas Arriba






EDUARDO GALEANO



A Escola do Mundo ao Avesso

La Escuela del Mundo al revés



>> Curso básico de injustiça


A publicidade manda consumir e a economia o proíbe. As ordens
de consumo, obrigatórias para todos, mas impossíveis para a
maioria, são convites ao delito. Sobre as contradições
de nosso tempo as páginas policiais dos jornais ensinam
mais do que as páginas de informação política e econômica.

Este mundo, que oferece o banquete a todos e fecha
a porta no nariz de tantos, é ao mesmo tempo igualador
e desigual: igualador nas ideias e nos costumes que
impõe e desigual nas oportunidades que proporciona.



Trad. Sergio Faraco



DE PERNAS PRO AR / PATAS ARRIBA




>> O Ensino do Medo

Num mundo que prefere a segurança à justiça, há
cada vez mais gente que aplaude o sacrifício
da justiça no altar da segurança. Nas ruas das
cidades são celebradas as cerimônias. Cada
vez que um delinquente cai varado de balas,
a sociedade sente um alívio na doença que a
atormenta. A morte de cada malvivente
surte efeitos farmacêuticos sobre os
bem-viventes. A palavra farmácia vem de
phármakos, o nome que os gregos davam às
vítimas humanas nos sacrifícios oferecidos
aos deuses nos tempos de crise.



Trad. Sergio Faraco



DE PERNAS PRO AR / PATAS ARRIBA




>> O medo global


Os que trabalham têm medo de perder o trabalho.

Os que não trabalham têm medo de nunca encontrar
trabalho.

Quem não tem medo da fome, tem medo da comida.

Os motoristas têm medo de caminhar e os pedestres
têm medo de ser atropelados.

A democracia tem medo de lembrar e a linguagem
tem medo de dizer.

Os civis têm medo dos militares, os militares têm
medo da falta de armas, e as armas têm medo da
falta de guerras.

É o tempo do medo.

Medo da mulher da violência do homem e medo do
homem da mulher sem medo.

Medo dos ladrões, medo da polícia.

Medo da porta sem fechaduras, do tempo sem relógios,
da criança sem televisão, medo da noite sem comprimidos
para despertar.

Medo da multidão, medo da solidão, medo do que
foi e do que pode ser, medo de morrer, medo de viver.




Trad. Sergio Faraco


DE PERNAS PRO AR / PATAS ARRIBA

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