CARPINEJAR
Influenciável,
tremendamente influenciável.
Tudo
o que não foi dito me influencia.
Um
homem secando o suor com lenço
me
influencia.
Uma
mulher catando os anéis das latas
me
influencia.
Um
cão seguindo o cavalo
me
influencia.
…
Fico
caseiro em trânsito,
tranco-me
fora de casa.
Sou
complicado para as tarefas simples
e
simples diante das complicadas.
Desisti
de explicar
como
chegar a determinada rua.
Tenho
o desvio como dom.
Ando
colado aos corredores,
esperando
ser sugado por uma porta.
Presto
atenção ao que não foi dito.
Preencho
o que não lembro com assobios.
Simples,
previsível, falível.
Ajudo-me
a cair.
Simples,
previsível, falível.
Minha
alegria pode ser medida
pela
conta do telefone.
…
Entendo
a metade das frases e adivinho o resto.
O
homem nunca é pedra.
O
homem nunca é perda.
Era
um Natal chuvoso.
Esfregava
o vidro como quem termina uma carta.
O
rio encostava na parede para se ouvir.
A
memória guarda o essencial e elimina as datas.
A
memória não decora sua rua.
Arrumamos
a mesa. Colocamos velas e nozes.
Provocamos
o fogo como quem amola facas.
Cantamos
a noite inteira.
Se
faço pausa hoje, escuto o trincar
dos
corpos, dos dentes, a grilaria dispersa,
o
abraço sem fechar o pouso, o pouco.
Improvisava
o que eu seria.
Minhas
roupas viveram demais
para
voltar ao meu corpo.
…
O
que sobra é vício. O que falta é virtude.
Não
me importa o desperdício,
mas
o dinheiro miúdo que a mãe
recolhe
na bolsa para passear com seus filhos,
reservado
para comprar o cacho de pães,
a
semana miúda que um jovem guarda
para
gastar com a namorada num motel
sem
ar-condicionado e com vista aos corredores.
Eu
me importo com as pessoas
que
vivem sem explicação.
in:
Livro de Visitas / 2005
blog
do autor
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