quarta-feira, 15 de maio de 2013

2 poemas de CARLOS NEJAR - Os Viventes






CARLOS NEJAR

(RS, 1939-)



GIORDANO BRUNO FALA AOS SEUS JULGADORES


Não é a mim
que condenais.

Nada podeis
roubar-me.
A verdade sofreu
e eu sofri
no grão dos ossos.

A vida não me veio
para mim.
E servirei de vau
a seu moinho.

Não cedo
o que aprendi
com os elementos.

Prefiro o fogo
à vossa complacência.
E o fogo não remói
o que está vendo.
Abre flancos
no avental
das cinzas esbraseadas.

O fogo
de flamejante língua
e sem coleira:
morde.
E testemunha
sem favor dos anjos.

Não é a mim
que condenais.

A Inquisição
vos fragmentou
e ao vosso juízo.
A ciência toda
à aparência de outra
que nada em nós
como se fora água
do coração.


Eu me fiei
ao universo
e sou janela de harmonia
indelével.

Não vos julgo.

O que se move
é a história
no caule da fogueira.

Sou de uma raça
que procede do fogo.

Não poderei calar-me.








BALADA AOS HERÓIS DAS BATALHAS


Os mortos já repousam
plácidos junto ao relvado
de um dia pleno, saciado.
A história que foi vivida
alma adentro: seus temores
vencidos, amores findos,
com eles jaz. A batalha
e seu fragor, sua mortalha
o ar resguarda, suas vozes
no descampado ainda vagam.
O canto da terra neles
e a dor ficou sob o céu,
com lençóis alvos, bordados
de pedra e ervas. O véu
da morte num sorvo apagam,
coesos, que a morte tomba,
assim que na onda os prende.
Ou morre a morte na lava
da primavera que come
folhas, sombras. E mais nada
que o nada encobre. Por eles
nenhuma paixão ou sede
em chão desarmado chora.
E às vezes, revoam, aves
enquanto as flores se abrem
pelos seus ossos de aurora.



in: Os Viventes / 1999





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