quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Estilhaços de Estilhaços no Lago de Púrpura


 
Cinco Estilhaços

de

Estilhaços no Lago de Púrpura
Shatters in the Lake of Purple

2009

Joaquim Palmeira - Wilmar Silva


two

/ i come with branches of thorns in the flesh
i scatter blades and knifes in the eyes of feet,
even more / i saw a bird / of wings in the arms
me coyote / me hyena was born in a borderless river,
fishlike poisoned by very dives into earth
i lost in the dark of late night behind you
me a desert: a hurt bird in the desert me:
only a hunter reaches an otter at the back
am coming armed with darts and arrows /
for an arrow caught in the navel my tongue
for a dart melted in the groin the mouth of kisses


trad. LdeM


dois


/ eu que venho com um ramalhete de espinhos na carne
derramo lâminas e facas nos olhos dos pés.
ainda sim/ serro um pássaro/ de asas nos braços
coiote eu/ eu hiena nascer de um rio sem margem.
piscoso envenenado de tanto mergulhar na terra
eu perdido no escuro da madrugada atrás de você
um ermo eu: uma ave ferida no ermo eu:
apenas um caçador alcança a lontra no dorso
sou eu este que vem armado de flechas e dardos/
para uma flecha presa no umbigo a minha língua
para um dardo derretido na virilha a boca de beijos




eight


in twilight of arrangements of birds and flowers /
am arrowhurt in despair of love closing
my eyes before the sun dawning sunflowers /
am this alien of caquis and rubies / am this
primal coloured by dawn at the top of the forest
and so dense forest and more thick than peach,
am devoured in hunger of my sex witted in ecstasy,
i plot a word or cool off my poem / me
strange indio, face of scarecrow shaman, i shut
my mouth with a medusa stopped in petals /
i would make a stable to conceive the love


trad. LdeM



oito

no lusco-fusco de arranjos de pássaros e flores /
eu sou flechado no desespero do amor que fecha
meus olhos antes que o sol amanheça girassóis /
eu sou este alienígena de caquis e rubis / sou este
primevo que a aurora colore no cume da floresta
e que floresta tão densa e mais espessa que pêssego,
sou comido na fome de meu sexo murcho no êxtase,
enredo uma palavra ou arrefeço meu poema / eu
índio estranho, face de espantalho xamã, calo
minha boca com uma medusa estanque na corola /
eu faria uma estrebaria para conceber o amor




twenty


iris, retinas, my eyes looking iris, retinas
eyes closing iris, retinas, eyes of venus
/ who is this lunar venus i never know
and i know i lost a panther, a drag of ties,
a patativa, an inflamed sun at midnight / me
now what do i make with iris, retinas, eyes :
i will close eyelids and create iris,
retinas, eyes will be iris, retinas, eyes /
you with your iris, retinas, you with eyes
looking me and disclose iris, retinas,
eyes and more than eyes , am all lechery /


trad. LdeM


vinte

íris, retinas, olhos meus olham íris, retinas
olhos que cerram íris, retinas, olhos de vênus
/ quem é esta vênus lunar que sequer conheço
e sei que perdi uma pantera, uma draga de laços,
uma patativa, um sol aceso em noite plena / eu
agora o que faço com íris, retinas, olhos :
hei de cerrar as pálpebras e inventar íris,
retinas, olhos que sejam íris, retinas, olhos /
você com suas íris, retinas, você com olhos
que me olhem e descubram íris, retinas,
olhos e mais que olhos, sou todo lascívia /


...


twenty four


you coming with a herd of knife-edges, blades /
coming with a wolf in pack and lost in shoal,
a puma, an animal with rhymes labeled lyrical
and only a pitchfork to exterminate the vords,
the fireflies, a capybara, a little horse me / i
am desolated in front of you only i see so far away:
where nor virginal mares piss on the straw / i
find a hyena among wolves / this hyena
has jaças and jacus making circles around waist
enmesching my hips of scimitar, macaws
cicadas at border of pool of purple / am alone


trad. LdeM



vinte e quatro


você que vem com uma manada de gumes, lâminas /
vem com um lobo na matilha e se perde no cardume,
um puma, um animal com rimas que dizem líricas
e apenas uma forquilha para acabar com as aves,
os pirilampos, uma capivara, um potro eu / eu
acabado agora diante de você apenas olho longe:
onde nem éguas virgens deixam urinas no feno / eu
encontro uma hiena no meio da alcateia / esta hiena
tem jaças e jacus que fazem círculos na cintura
que enreda meu quadris de cimitarra, araras,
cigarras à beira do açude de púrpura / sou só




thirty

who are you says to throw away my soulless body
in this lake of purple where am this imitation
of a god, a shaman, a poet more hopeless
than the hopelessness that hopes for you and says
your name tonight through whole myself
and am this scared one more than abandon /
am this green burning your body / me
with you caught in myself i will make a woods
to calm my love and even you say rubies
am this fountain of water with iris, retinas, eyes,
always avid / me wilmar silva, avid for you


trad. LdeM



trinta

quem é você que diz lançar meu corpo sem alma
neste lago de púrpura onde sou esta imitação
de um deus, um xamã, um poeta mais desesperado
que o desespero que espera por você e diz seu
nome no meio da noite que me atravessa inteiro
e sou este que apavorado é mais que um abandono /
sou este verde que hei de queimar seu corpo / eu
com você preso em meu ser hei de fazer um bosque
que apazigue meu amor e mesmo que você diga rubis
sou esta fonte d'água com as íris, retinas e olhos
sempre ávidos / eu wilmar silva, ávido por você /



fonte: SILVA, Wilmar. Estilhaços no Lago de Púrpura = Astillas en el Lago Púrpura = Débris sur un Lac Pourpre = Shatters in the Lake of Purple. Belo Horizonte: Anome Livros; São Domingos: Centro Cultural Brasil – República Dominicana; Embaixada do Brasil na República Dominicana, 2009.


mais sobre Estilhaços / Joaquim Palmeira - Wilmar Silva







online



segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Drummond - Especulações / Spekulationen





Carlos Drummond de Andrade


Especulações em torno da palavra homem

Spekulationen über das Wort Mensch


Was für ein Ding ist der Mensch,
Was steht hinter dem Namen Mensch:
Eine Geographie?

Ein metaphysisches Wesen?
Eine Fabel ohne Zeichen
Das sie entziffert?

Wie kann der Mensch
Sich selber fühlen
Wenn die Welt schwindet?

Wie kann der Mensch
Neben einem anderen Menschen bestehen
Ohne seinen Namen zu verlieren?

Verliert er nicht seinen Namen,
Und das Salz das er ißt,
Vermehrt oder vermindert

Es ihm nichts
Vom Erbe des Vaters?
Wie wird ein Mensch?

Nur durch Schlafen,
Sich Paaren, in der Erwartung
Daß dem Unterleib

Die Blüte des Menschen entkeime?
Wie sich selber
Machen bevor

Man den Menschen macht?
Bevor man den Vater herstellt
Und den Vater davor und einen dritten Vater

Und einen noch früheren Vater
Als den ersten Menschen ?
Was ist der Mensch wert ?

Weniger, mehr als sein Gewicht?
Heute mehr als gestern?
Ist er alt wnieger wert?

Ist er tot weniger wert?
Einer weniger als ein anderer,
Wenn der Wert des Menschen

Das Maß des Menschen ist:
Wie stirbt der Mensch,
Wie beginnt er zu sterben?

Ist sein Tod Hunger
Der sich selber ißt?
Stirbt er bei jedem Schritt ?

Wenn er schläft, stirbt er?
Wenn er stirbt, stirbt er?
Der Tod des Menschen,

Ähnelt er dem Gummi
Den er kaut, dem Punsch
Den er schlürft, dem Schlaf

Den er spielt, ungewiß
Ob er nah, ob er fern ist?
Wenn er stirbt, träumt der Mensch?

Warum stirbt der Mensch?
Erstrebt er eine andere Form
Des Existierens ohne Leben?

Wittert er ein anderes
Unwiederholtes Leben
An einem Horizont des Wahns?

Sucht er einen anderen Menschen?
Warum gehen Tod und Mensch
Hand in Hand

Und sind die Stunden
des Menschen só erheiternd?
Was für ein Ding ist der Mensch?

Hat er Angst vor dem Tod,
Tötet er sich, ohne Angst?
Oder ist die Angst die ihn tötet

Mit einem silbernen Dolch,
Mit einem Krawattenknoten,
Mit einem Sprung von der Brücke?

Warum lebt der Mensch?
Wer zwingt ihn dazu,
Den schuldlosen Gefangenen?

Wie lebt der Mensch,
Wenn es sicher ist daß er lebt?
Was verbirgt er hinter seiner Stirn?

Und warum erzählt er nicht
Sein ganzes Geheimnis
Selbst in versteckter Sprache?

Warum lügt der Mensch?
Lügt lügt lügt
Verzweiflungsvoll ?

Warum verstummt er nicht
Wenn die Lüge spricht
In allem was er fühlt?

Warum wint der Mensch?
Welches Weinen wiegt
Das Übel auf Mensch zu sein?

Was ist der Schmerz Mensch zu sein?
Wie kann der Mensch entdecken
Was ihn schmerzt ?

Hat der Mensch eine Seele?
Und wer pflanzte in die Seele
Etwas das sie zerstört?

Wie weiß der Mensch
Was seine Seele ist
Und was eine namenlose Seele ist?

Wozu dient der Mensch?
Um Blumen zu düngen,
Um Geschichten zu spinnen?

Um dem Menschen zu dienen?
Um Gott zu erschaffen?
Weiß Gott vom Menschen?

Weiß der Teufel von ihm?
Wie will der Mensch
Bestimmung sein, und Quelle ?

Welches Wunder ist der Mensch?
Welcher Traum, welcher Schatten?
Existiert der Mensch?



Trad. Curt Meyer-Clason / 1965


original em :





Carlos Drummond de Andrade Poesie


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Glossário Revisado - by LdeM




Glossário Revisado


Trânsito: situação na qual se fica parado.

Hospital : instalação precária onde se vai para morrer.

Posto de Saúde: local público onde se reclama do atendimento médico precário
e se apanha do guarda municipal.

Escola : local onde se pode humilhar os colegas e bater nos professores.

Prisão: escola onde se aprende as artes do crime e aprimora requintes de violência.

Delegacia: local onde se apanha da polícia e se oculta a face das câmeras.

Shopping Center : instalação ilusória e asséptica onde tudo pode ser comprado
(até a auto-estima).

Biblioteca: espaço de amontoamento de livros que pouquíssimos fanáticos leem.

Computador: plataforma midiática para jogos eletrônicos, redes sociais,
blogs confessionais, filmes pornô e outros vícios digitais.

Arte: fenômeno de explícita vaidade de seres egóicos e exibidos.

Futebol: empresa de lucro abundante onde o que menos importa é o esporte.

Empresa: espaço de competição entre explorados por mais
cargos e salários.

Religião: crenças para os devotos numa cosmo-explicação que
serve aos propósitos manipuladores das castas sacerdotais.

Ideologia: ficcionalidades nas quais alguns poucos visionários ou fanáticos
(enquanto a maioria é manobrada).

Eleição: jogo de cartas marcadas para a alternância de gerentes dos
mesmos poderes que governaram antes.

Partido Político : instância convencionada de defesa de interesses arrivistas,
lobbies e caixas-dois em nome do bem-estar público.

Propaganda: fenômeno onde a mentira repetida torna-se verdade aceita.

Mídia: espaço pleno de exibicionismo e falsificação dos fatos .

Cidadão : tanto mais respeitado quanto mais se apresenta como consumidor
em potencial, quanto mais narcisista e egoísta.

Consumidor: gastador compulsivo de verbas presentes e futuras, reais e virtuais; comprador voraz de mercadorias, serviços e promessas.

Cinema: diversão alucinatória retroalimentada por mocinhos, vilões, beldades,
tiroteios, saltos mortais e efeitos especiais.

Carro: objeto de status, sonho de consumo, a ser exibido no modelo
do ano, a ser pago em infindas prestações.

Casa Própria: não se trata de um direito ao abrigo, mas de um luxo,
a ser trocado por votos de benévolos políticos.

Casamento: instituição social com ampla flexibilidade de casal para casal,
variando de classe para classe, com ou sem bens em comum.

Concurso Público: cabide de empregos para os arrivistas de classe média e
demais apadrinhados das digníssimas autoridades.

Corrupção: fenômeno que acontece nas esferas inacessíveis
do poder público (onde uma mão sempre está disposta a lavar a outra).

Democracia : sistema de voto para eleição dos que gastam mais verbas
nas campanhas midiáticas milionárias.

Liberdade: possibilidade de escolhas de mercadorias, candidatos midiáticos,
tipos de roupas & cortes de cabelo, programas de TV etc

Privacidade: antigo direito de não ser fotografado, filmado, escaneado, etc
mas que pode ser negociado /trocado por um gordo cachê ou
prometida segurança.

Segurança: ilusão de bem-estar e proteção, em nome da qual o indivíduo
se deixa registrar, fotografar, filmar, escanear, revistar, processar etc

Suborno: contribuição voluntária às mui prezadas autoridades (in)competentes.

Televisão: dispositivo de influência comportamental e lavagem cerebral à serviço
da famigerada indústria cultural.

Telenovela: onde a realidade palpita mais forte do que no vivenciado.

Dicionário: conjunto de palavras que a maioria desconhece e nunca vai usar
(exceto os bacharéis).



nov/12


Leonardo de Magalhaens