quarta-feira, 7 de março de 2012

ODE SENSACIONAL - Prólogo / Ode Urbana



ODE SENSACIONAL


(trechos)


Prólogo

Não queremos o lirismo dos luares e dos pastos verdejantes

Não queremos a melodia das aves no borbulhar das cachoeiras

Não queremos o sinfônico farfalhar das folhas outonais

Não queremos cantar sobre ninfas e faunos em peripécias eróticas

Não queremos discutir sublimidades metafísicas em soturna companhia!

Queremos a poesia das máquinas registradoras e das chamadas telefônicas

Queremos a poesia e o bailar dos
megabytes na rede mundial de computadores

Queremos a dinâmica superaquecida das pistas de dança

Queremos a invasão cegante das legiões de faróis

Queremos a imundícia das ruas e a brisa fétida das latrinas públicas

Queremos a arrogância das cercas elétricas e a afronta dos portões eletrônicos

Queremos o ambiente asséptico dos
shoppings e a paz marcial dos condomínios

Queremos o cansaço diário dos operários nas engrenagens das máquinas

Queremos a estupidez galopante dos escravos voluntários

Queremos o desnível das riquezas e a desigualdade dos atores sociais

Queremos a exploração do suor alheio e a falta de oportunidades

Queremos os cartazes de propaganda com a Musa televisiva de biquíni

Queremos os desequilíbrios econômicos e as variações das taxas de juros

Queremos o insone carisma dos líderes pastoreando as multidões histéricas

Queremos o estrondo dos morteiros e o metralhar dos subúrbios em guerra

Queremos a perversidade inerente às falsas flores de plástico !



Ode Urbana

 
fluxos torrenciais de faróis encobrem o anoitecer de fuligens

nas avenidas de contornos serpentinos e labirintos de alamedas

onde trinta e sete por cento da população economicamente ativa vive na informalidade do subemprego

ou vultos se abrigam sob as tendas de concreto armado –

elevados cruzam hipervias em alta velocidade Setenta por cento dos veículos com IPVAs em dia 
 em velocidade superior a sessenta quilômetros por hora

quando os quatro vagões do metro ( e suas quarenta janelas) iluminam os pilares dos viadutos

e dois vultos em trapos contemplam o desfile cinematográfico de faces e olhares se derramam na sucessão de trilhos e luzes noturnas

os pirilampos frutos de monstruosas turbinas de grotescos
megawatts
fritando as pupilas e impulsionando os motores e roldanas
nos níveis e subníveis de plataformas e estações

e os subterrâneos e os quilômetros de canais e quilômetros de fios sepultados
e as galerias e sondas e trituradoras e carrinhos de tração

extraindo riqueza do subsolo para a ganância dos escritórios
nos arranha-céus de argamassa e vidro a flutuarem meio aos anúncios de
néon

quando não ofuscados pela fuligem das chaminés pós-industriais
nas torres pós-modernas de alumínio e isopor e laminados e recicláveis

onde funcionários sorridentes ocultam o estresse diário sob roupas de fios artificiais 
de conhecida marca

em cortes de alta costura e detalhes os mais inusitados
manuseando teclas e mensagens nos telefones celulares
sob a carícia dos condicionadores de ar nos mundos lacrados

no paraíso das máquinas em apoteose nos domínios virtuais na eficiência topográfica
das infovias no mainfream dos servidores

na performance tecnoestética dos supercondutores
até os limites do deserto do real palmitando o cyberespaço das neo-mitologias digitais

quando a tecla pressionada responde ao toque com promessas de orgasmos
no cruzamento de magias e tecnologias de última (e pós-última) geração

engavetando juventudes nos vãos dos edifícios suburbanos
nas velocidade tremulantes dos coletivos intermunicipais
além de conflitos de ocupação dos espaços públicos (e dos serviços públicos)

quando as autoridades buscam o Bem-Estar Social e o bem comum 
através do poder público (segundo consta nos parágrafos e incisos 
da Lei Orgânica do município )

na paisagem lunar dos estacionamentos no abandono das autopistas noite adentro
sob a névoa rubra de mercúrio na brisa arrepiando o asfalto

no agito das lojas de conveniência e artigos para consumo

no trânsito vertiginoso de veículos de duas rodas nos acidentes com fratura múltipla

sob os lampiões voltaicos e a lua cheia fatiada por fios de alta tensão.



by Leonardo de Magalhaens


http://leoleituraescrita.blogspot.com


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