segunda-feira, 26 de março de 2012

Melodia Noturna de Azul Profundo - conto







MELODIA NOTURNA DE AZUL PROFUNDO

 
Desperto por um breve sustenido, em suspenso, ascendendo para um allegro. Toques de uma sonata em notas etéreas, acordes volúveis. Teremos uma suíte completa? Mas havia algo mais ali. O piano não estaria trancado? "Melissa, minha querida, acho que a lição terminou." Uma leve vibração percorreu o ar, e também sua face, ouviu-se a solfejar uma sequência fragmentar de fá, si, dó, ré , fá bemol, si.
A porta se perdia naquela bruma ébria de escuridão e tédio, ferida aqui e ali por reflexos tímidos dos lampiões da ladeira, dançantes como sinistros fogos-fátuos, porém incapazes de assustar a quem é assim despertado em plena conflagração de sono e descrença.
Tropeçando pelos corredores, já não havia Melissa nem fim de lição, havia a tocata, a fuga, as notas ora alegres ora tétricas, havia o chamado.
Apoiando-se no corrimão, unhas agarrando uma testa enrugada, desalinhando o cabelo caído sobre as orelhas, sentindo cada degrau da escada, descendo, a repuxar o roupão, viu-se assim no tapete da sala.
Havia a melodia e o piano. Debruçada sobre o piano, concentrada no bailado das notas, havia uma mulher.
A mulher ondulava com os acordes, flutuava com os bemóis, trilhava as escalas, toda entregue às notas e pausas, ao ritmo dos compassos, andamentos da alma despejados no martelar das teclas. Os dentes de marfim subiam, desciam, solidários, no baralho de contrapontos, obedientes aos dedos leves, unhas deslizando em barras negras, a mulher que trajava um ondulante vestido azul noturno, um anil profundo, mas cintilante, em golas e bordados num tom violáceo, um broche de prata, uma sandália no mesmo azul. Em tudo uma fascinante áurea azul, tão instável, qual bolha frágil, o vestido de abismado anil, o cabelo preso numa trança dupla, despejada em cascatas, tal como a arieta.
Parecia-lhe que uma brisa insinuava-se pelas frestas das janelas altas, numa carícia de frescor, engolfando a melodia em ondas na luz mortiça que preenchia a sala, como a originar-se em tudo e lugar algum. Que sombras bruxuleavam na penumbra?
Tecia as questões como uma rede para a mulher de anil, mas ela só podia conceder-lhe a música, ela que era a própria melodia. "É, parece que continuo só"
Então ele se voltou, e nos seus passos rumo a escada, não olhou para trás, não viu que ela se esvaía, sempre atenta, a solista que interpreta a si mesma como tema. Entregando-se, absorta em seus espasmos, a ele, o homem que conquistara ao sono.
É este homem que trilha o corredor, trôpego, guiado pelos fogos-fátuos, as mãos úmidas comprimindo as têmporas, resistindo às últimas notas da sereia anil, ao sentir-se nova criança, abraçando as almofadas macias, buscando refúgio, mergulhando no profundo anil do labirinto dos sonhos.


Mai02

Leonardo de Magalhaens

http://leoleituraescrita.blogspot.com

 

segunda-feira, 19 de março de 2012

Poemaremos Sem Fim (a Revanche!)





POEMAREMOS SEM FIM (A Revanche!)

Dedicado ao cyberpoet Lecy Pereira Sousa



Poemaremos sem fim inventando palavras
e deturpando ordens semânticas

Poemaremos nos monitores das lan houses
nos cardápios da praça de alimentação
nos guardanapos dos copos-sujos da zona boêmia
nos rasgos de jornais disponíveis nos banheiros públicos

Poemaremos nos desfiles das escolas de samba
poemaremos assistindo as finais do campeonato
poemaremos assistindo os filmes de terror
e a propaganda eleitoral gratuita
ou relendo os clássicos europeus
ou plagiando versos dos nossos poetas favoritos
ou decorando os elementos químicos da tabela periódica

Poemaremos esperando o Apocalipse e o Juízo Final
poemaremos na odisseia urbana da ilíada midiática

Poemaremos lucidamente extasiados
dopados escandalizados desafinados

Poemaremos evidentemente convertidos
submetidos divertidos compungidos

Poemaremos - não temos pressa - poemaremos -
no compasso

Poemaremos na parada gay tomaremos um drink
no rainbow bar
Visitando o museu dos poetas beatniks
o museu das utopias socialistas
o museu do Clube da Esquina
o museu dos ideais libertários

Poemaremos nas ondulações do yellow submarine
além dos strawberry fields forever
tropeçando nas pedras rolantes
navegando sem rumo no barco bêbado

Poemaremos sentados nas praças públicas de luz néon

Poemaremos viajando de pé nos ônibus suburbanos
Ou mijando a bordo de um ônibus interestadual
Colecionando antologias poéticas e almanaques de
celebridades
Ou doando sangue para mil acidentados nas rodovias
da morte
Reclinando no dentista em plena estimulação acústica do
motorzinho

Poemaremos sem fim sem começo
traficando informações
garimpando poéticas high tech nos sinais de trânsito
dependurando poemas nos assentos dos coletivos do hipercentro
Ou contribuindo para o fundo de recursos para os poetas falidos
na caridade assistencialista para as vítimas da guerra social

Poemaremos sem fim sem eira nem beira
com microchips implantados
Com torsões de dedos e nervos diante do jornal nacional
com as banalidades formatadas
com dores de tendão e de consciência ao digitar o número
do candidato em reeleição
com náuseas existenciais ao constatar os índices de consumismo
e desperdício

Poemaremos tomando coca-cola no McDonald's
poemaremos comendo esfiras no Habib's
ou folheando o tablóide Super
ou comprando CDs em promoção nas Lojas Americanas
ou consumindo ávidos as 'queimas de estoques' das Casas Bahia

Poemaremos nas pizzarias de sábado à noite e nas
churrascarias de domingo à tarde
nas pescarias de fim-de-semana e nas festinhas infantis

Poemaremos sem finalidade específica
na praia em férias de verão na hora das refeições
no show da melhor banda de todos os tempos

Poemaremos gritando "Sieg Heil!" e "Deutschland uber alles!"
Poemaremos gritando "Viva la Revolución!" e
"De pé, ó vítimas da fome!"

Poemaremos sóbrios e bêbados de cair
De salto alto e humildes ajoelhados
Empinando pipas ou mergulhando em piscina de lona
despejando cargas de libido em produtos enlatados
e bonecas infláveis
transando no escurinho do cinema ou pulando de
bungee-jumping

Poemaremos sentados no próprio estrume
e poemaremos pintando o quarto de vermelho berrante

Poemaremos bolinando as mocinhas inocentes
e poemaremos soprando camisinhas com sabor morango
subindo nos miradouros e escalando torres de TV
empilhando panfletos de eleição e queimando 'santinhos'
em ato público

Poemaremos sambando no trio elétrico
ou na pena de morte na cadeira elétrica
Caindo da utopia social ou dinamitando ilusões juvenis

Poemaremos na implosão das torres gêmeas
e na guerra pós-coloniais
Fugindo da artilharia aérea ou submergindo
na mancha de óleo

Poemaremos por teimosia e falta de opção

Poemaremos poemaremos poemaremos poe
ma re mos
Poemaremos poemaremos poemaremos poe
ma re mos


28/29set08


pensado meditado ponderado
no 1º Viva Poesia
no Parque Ecológico do Eldorado
e escrito na madrugada e amanhecer do dia...


Leonardo de Magalhaens


...

mais sobre o Poemaremos Sem Fim (original)
do poeta Lecy Pereira Sousa








quarta-feira, 14 de março de 2012

Ai deturpatori dell'amore / Aos deturpadores do Amor





Ai deturpatori dell'amore
Diovani Mendonça



Se dovrai picchiare, picchia.
Ma in faccia alla tua codardia.

Se dovrai strappare, strappa.
I capelli alla tua prodezza.

Se dovrai spaccare, spacca.
La fronte della tua ipocrisia.

Se dovrai perforare, perfora.
Gli occhi della tua gelosia.

Se dovrai premere, premi.
Il grilletto sul naso del tuo fato.

Se dovrai tirare, tira.
Le orecchie del sentimento di possesso.

Se dovrai scheggiare, scheggia.
Le unghie della tua vanità.

Se dovrai ingabbiare, ingabbia.
La tua irrazionale animalità.

Se dovrai incendiare, incendia.
La casa e il cortile della tua crudeltà.

Se dovrai amputare, amputa.
I muscoli della tua prepotenza.

Se dovrai pestare, pesta.
La bocca alla tua ignoranza.

Se dovrai rompere, rompi.
I denti alla tua arroganza.
Se dovrai tagliare, taglia.
La tua lingua che ammalia.

Se dovrai inforcare, inforca.
La gola della vendetta.

Se dovrai avvelenare, avvelena.
Il ventre della tua insicurezza.

Se dovrai mitragliare, mitraglia.
La vetrata della tua sfiducia.

Se dovrai sparare, spara.
Nel petto della tua amarezza.

Se dovrai legare, lega.
Le zampe della tua forza-bruta.

Se dovrai mozzare, mozza.
Le dita della follia.

Se dovrai pugnalare, pugnala.
Le gambe lunghe della tua menzogna.

Se dovrai imprigionare, imprigiona.
Le mani e i piedi della tua ira.

Se dovrai soffocare, soffoca.
Il grido della tua disperazione.

Se dovrai affogare, affoga.
Le tue sofferenze finalmente.

Se dovrai uccidere, uccidi (e ben ucciso!).
L'egoismo dentro di te.

Rifletti ... Solleva la testa e volta la pagina
e dunque nessuno debba fare nulla di tutto ciò.



tradução para o italiano: Guido Boletti




http://www.guidoboletti.net/

http://www.youtube.com/watch?v=xR2G8nS_fh8

http://diovmendonca.blogspot.com/


quarta-feira, 7 de março de 2012

ODE SENSACIONAL - Prólogo / Ode Urbana



ODE SENSACIONAL


(trechos)


Prólogo

Não queremos o lirismo dos luares e dos pastos verdejantes

Não queremos a melodia das aves no borbulhar das cachoeiras

Não queremos o sinfônico farfalhar das folhas outonais

Não queremos cantar sobre ninfas e faunos em peripécias eróticas

Não queremos discutir sublimidades metafísicas em soturna companhia!

Queremos a poesia das máquinas registradoras e das chamadas telefônicas

Queremos a poesia e o bailar dos
megabytes na rede mundial de computadores

Queremos a dinâmica superaquecida das pistas de dança

Queremos a invasão cegante das legiões de faróis

Queremos a imundícia das ruas e a brisa fétida das latrinas públicas

Queremos a arrogância das cercas elétricas e a afronta dos portões eletrônicos

Queremos o ambiente asséptico dos
shoppings e a paz marcial dos condomínios

Queremos o cansaço diário dos operários nas engrenagens das máquinas

Queremos a estupidez galopante dos escravos voluntários

Queremos o desnível das riquezas e a desigualdade dos atores sociais

Queremos a exploração do suor alheio e a falta de oportunidades

Queremos os cartazes de propaganda com a Musa televisiva de biquíni

Queremos os desequilíbrios econômicos e as variações das taxas de juros

Queremos o insone carisma dos líderes pastoreando as multidões histéricas

Queremos o estrondo dos morteiros e o metralhar dos subúrbios em guerra

Queremos a perversidade inerente às falsas flores de plástico !



Ode Urbana

 
fluxos torrenciais de faróis encobrem o anoitecer de fuligens

nas avenidas de contornos serpentinos e labirintos de alamedas

onde trinta e sete por cento da população economicamente ativa vive na informalidade do subemprego

ou vultos se abrigam sob as tendas de concreto armado –

elevados cruzam hipervias em alta velocidade Setenta por cento dos veículos com IPVAs em dia 
 em velocidade superior a sessenta quilômetros por hora

quando os quatro vagões do metro ( e suas quarenta janelas) iluminam os pilares dos viadutos

e dois vultos em trapos contemplam o desfile cinematográfico de faces e olhares se derramam na sucessão de trilhos e luzes noturnas

os pirilampos frutos de monstruosas turbinas de grotescos
megawatts
fritando as pupilas e impulsionando os motores e roldanas
nos níveis e subníveis de plataformas e estações

e os subterrâneos e os quilômetros de canais e quilômetros de fios sepultados
e as galerias e sondas e trituradoras e carrinhos de tração

extraindo riqueza do subsolo para a ganância dos escritórios
nos arranha-céus de argamassa e vidro a flutuarem meio aos anúncios de
néon

quando não ofuscados pela fuligem das chaminés pós-industriais
nas torres pós-modernas de alumínio e isopor e laminados e recicláveis

onde funcionários sorridentes ocultam o estresse diário sob roupas de fios artificiais 
de conhecida marca

em cortes de alta costura e detalhes os mais inusitados
manuseando teclas e mensagens nos telefones celulares
sob a carícia dos condicionadores de ar nos mundos lacrados

no paraíso das máquinas em apoteose nos domínios virtuais na eficiência topográfica
das infovias no mainfream dos servidores

na performance tecnoestética dos supercondutores
até os limites do deserto do real palmitando o cyberespaço das neo-mitologias digitais

quando a tecla pressionada responde ao toque com promessas de orgasmos
no cruzamento de magias e tecnologias de última (e pós-última) geração

engavetando juventudes nos vãos dos edifícios suburbanos
nas velocidade tremulantes dos coletivos intermunicipais
além de conflitos de ocupação dos espaços públicos (e dos serviços públicos)

quando as autoridades buscam o Bem-Estar Social e o bem comum 
através do poder público (segundo consta nos parágrafos e incisos 
da Lei Orgânica do município )

na paisagem lunar dos estacionamentos no abandono das autopistas noite adentro
sob a névoa rubra de mercúrio na brisa arrepiando o asfalto

no agito das lojas de conveniência e artigos para consumo

no trânsito vertiginoso de veículos de duas rodas nos acidentes com fratura múltipla

sob os lampiões voltaicos e a lua cheia fatiada por fios de alta tensão.



by Leonardo de Magalhaens


http://leoleituraescrita.blogspot.com


sexta-feira, 2 de março de 2012

Poemas [ em francês ] de Murilo Mendes



Murilo Mendes


in: Papiers / 1974
In: Poesia Completa e Prosa . Vol. IV. 1994



Para Guillaume Apollinaire


As chamas me têm falado aos pés
Elas desvelam os segredos do inferno
Muito mais visível que o céu

A roseira esta tarde gera os cravos
para que as bonecas possam olhar pelos olhos dos outros
Qual caminho eu devo percorrer
Tenha piedade de mim emigrante que fugiu do céu

Me caçaram de minha juventude sem fotos
Me caçaram da morte monumento de cristal
Perdão a estrela azul

Aprenda de mim cascatas sanguessugas
Aprenda de mim recém-nascidos

Estou numa ilha batida de ventos de bronze
ninguém se lembra de mim
Tenho atuado tal um personagem
E agora sou devorado por ele
Sinos ouçam-me

A terra funde sobre mim como uma asa ou um beijo
Os augúrios tombam sobre a praia
Manequins de areia
Preciso do veneno
Que me rendia a maldade a violência
Eu não tenho senso político nem senso religioso
Qualquer um é meu fantasma
Me copia à tinta da China
Quem sou eu?

Encontre-me a chave do porvir
Odeie-me
Com a ajuda de pianos e bíblias voadoras
Enquanto os Primeiros Pais continuam no trovão
Tão tranquilos quanto a cortiça
Fenômeno obediente


trad. livre: LdeM


POUR GUILLAUME APOLLINAIRE

Les flammes m'ont parlé aux pieds
Elles découvrent des secrets de l'enfer
Beaucoup plus visible que le ciel

Le rosier ce soir accouche des oeillets
Pour que les poupées puissent regarder par les yeux d'autrui
Quel chemin dois-je parcourir
Ayes pitié de moi émigrant qui fuis le ciel
On m'a chassé de m jeunesse sans photos
On m'a chassé de l amort monument de cristal
Pardon l'étoile bleue

Apprenez de moi cascades sangsues
Apprenez de moi nouveaux-nés

Je suis dans une île battue de vents de bronze
Personne ne se souvient de moi
J'ai joué un personnage
E maintenant je suis mangé par lui
Cloches écoutez-moi

La terre fond sur moi comme un aigle ou un baiser
Les augures tombent sur la plage
Mannequins de sable
Il me faut le poison
Qui me rendait la méchanceté la violence
Je n'ai pas de sens politique ni de sens religieux
Quelqu'un est mon fantôme
on me copie à l'necre de Chine
Qui suis-je?

Trouvez-moi la clef de l'avenir
Haïssez-moi
Avec l'aide de pianos et de bibles volantes
Pendant que les Premiers Parents se tiennent dans la tonnerre
Aussi tranquilles que le liège
Phénomène obéissant


Rio 28-7-1942

...



Homenagem a Max Ernst
Títulos para as cenas imaginárias


1-O imperador decapitado espera no vestíbulo a audiência do carrasco.

2-Levantando a crina o cavalo furioso esfrega no vento os fósforos do trovão.

3-Os labirintos se elevam durante a noite e descansam durante o dia.

4-Freud trajando à Fedra com grande decote me persegue manejando
as tenazes tipo luvas.

5-Um cérebro eletrônico planeja os sonhos ao alcance de todas as bolsas.

6-As espadas da ambiguidade assaltam a Europa após a chuva.

7-A cabeça de Salvador Dalí, bigodes comprimidos, se servem frias
sobre uma bandeja de prata, com enfeite de dólares.

8-As espiãs mudam seus sonhos durante o dia.

9-Dobrando sua saia de vidro azul a médium madame Récamier
se abana com uma borboleta gigante.

10-O antipapa (é uma mulher) coberta com um manto de serpentes
presas, a cabeça abaixo.

11-A noiva do vento assobia “La Carmagnole de l'Amour” em homenagem
às aves giratórias.

12-A pulsação do inseto vista ao telescópio de Palomar.


trad. LdeM


Notas:

Max Ernst (1891-1976) foi um poeta e artista plástico alemão que viveu em Paris. Um dos ícones do movimento Surrealista.

Carmagnole se refere a uma canção francesa, inspirada num tipo de jaqueta curta usada pelos sans-culottes, os trabalhadores da época do Ancien Régime.




HOMMAGE À MAX ERNST:
TITRES POUR DES TABLEAUX IMAGINAIRES


1-L'EMPEREUR DÉCAPITÉ ATTEND DANS LE VESTIBULE L'AUDIENCE
DU BOUREAU.

2-SOULEVANT LA CRINIERE LE CHEVAL FURIEUX FROTTE DANS LE VENT
LES ALLUMETTES DU TONNERRE.

3-LES LABYRINTHES S'ENVOLENT DURANT LA NUIT ER SE REPOSENT
PENDANT LE JOUR.

4-FREUD HABILLÉ EN PHÉDRE AU GRAND DÉCOLLETÉ ME POURSUIT
MANINAT DES TENAILLES FAÇON-GANTS.

5-UN CERVEAU ÉLECTRONIQUE PLANIFIE DES RÊVES A LA PORTÉE DE
TOUTES LES BOURSES.

6-LES ÉPÉES DE L'AMBIGUITÉ ASSAILLENT L'EUROPE APRÉS LA PLUIE.

7-LA TÊTE DE SALVADOR DALÍ, MOUSTACHES COMPRISES, SE SERT FROIDE
SUR UNA PLATEAU D'ARGENT, AVEC GARNITURE DE DOLLARS.

8-LES ESPIONNES ÉCHANGENT LEURS RÊVES PENDANT LE JOUR.

9-REPLIANT SA JUPE DE VERRE BLEU LE MÉDIUM MADAME RÉCAMIER
S'ÉVENT AVEC UN PAPILLON GÉANT.

10-L'ANTIPAPE (C'EST UNE FEMME) RECOUVERT D'UN MANTEAU DE
SERPENTS PRIE, LE TÊTE EN BAS.

11-LA FIANCÉE DU VENT SIFFLE “LA CARMAGNOLE DE L'AMOUR” EN
HOMMAGE AUX OISEAUX ROTATIFS.

12-LA PULSATION DE L'INSECTE VUE AU TÉLESCOPE DE PALOMAR.


Rome, 1965


in: Papiers / 1974

In: Poesia Completa e Prosa . Vol. IV. 1994


Murilo Mendes