quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

algumas cidades de CIDADES INVISÍVEIS de Italo Calvino





As Cidades Invisíveis
Le Città Invisibili

Italo Calvino


trad. livre – LdeM



As cidades e a memória . 2

Ao homem que cavalga longamente por terrenos selvagens vem o desejo de uma cidade. Finalmente alcança Isidora, cidade onde os palácios têm escadas em caracol incrustadas de caracóis marinhos, onde se fabricam à regra de arte telescópios e violinos, onde quando o forasteiro hesita entre duas mulheres lá encontra sempre uma terceira, onde a luta dos galos degeneram em rixas sangrentas entre os apostadores. Em todas estas coisas ele pensava quando desejava uma cidade. Isidora é então a cidade de seus sonhos: com uma diferença. A cidade sonhada continha-o jovem; a Isidora chega em idade tardia. Na praça há um mureto de velhos que aguardam passar a juventude; ele é atraído a fila com eles. Os desejos são agora recordações.” (trad. LdeM)




As cidades e a memória . 4


Além de seis rios e três cadeias montanhosas surge Zora, cidade que quem a tem visto uma vez não pode mais esquecer. Mas não porque ela deixa como outras cidades memoráveis uma imagem fora do comum nas recordações. Zora tem a propriedade de deixar na memória ponto por ponto, na sucessão das ruas, e das casas ao longo das ruas, e das portas e das janelas nas casas, porém não mostrando nossas belezas ou raridades particularidades. O seu segredo é o modo no qual a vista percorre suas figuras que se sucedem como numa partitura musical na qual não se pode mudar ou deslocar alguma nota. O homem que sabe de cor como é feita Zora, a noite quando não pode dormir imagina caminhar pelas ruas e recorda a ordem na qual se sucedem o relógio de cobre, o toldo listrado do barbeiro, o esguicho de nove jorros, a torre de vidro do astrônomo, a banca dos vendedores de melancias, a estátua do eremita e do leão, o banho turco, o café na esquina, a travessa que leva até ao porto. Esta cidade que não se apaga da mente é como uma armação ou retículo em cujos compartimentos cada um pode dispor as coisas que quer recordar: nomes de homens ilustres, virtudes, números, classificações vegetais e minerais, datas de batalhas, constelações, partes do discurso. Meio a todas as noções e todos os pontos do itinerário poderá estabilizar um nexo de afinidade ou de contraste que sirva de chamado instantâneo à memória. De modo que os homens mais sábios do mundo são aqueles que conhecem mentalmente Zora.

Mas inutilmente me desloco em viagem para visitar a cidade: obrigada a ficar imóvel e igual a si mesma para ser melhor recordada, Zora débil, se desfaz e desaparece. A Terra a tem esquecido.” (trad. LdeM)


Italo Calvino



para ouvir sobre outras cidades invisíveis ...




Um comentário: