DENISE
EMMER
Rio
de Janeiro, 1958-
O
INVENTOR DE ENIGMAS
Para
Moacyr Félix
Os
poetas carregam seus sacos de poeira
e
sobem e descem inúteis ladeiras...
levam
os poetas como se levassem filhos
nas
suas costas os mundos pesados de Carlos.
São
tão poucos para tantos mundos que existem
dentro
de tantos sacos imensos e cinzas
são
tão raros os sábios que sonham como pássaros
que
restarão países sobre países empilhados
Os
poetas escutam o ranger dos séculos
que
se abrem que se fecham como portas trágicas
a
poesia veste blusas claras em meninas mortas
ou
absolutamente não surpreenderá as guerras.
Se
um dia ela mudar os deuses de seus picos
a
ponto de evitar que um câncer se espalhe
no
organismo dos mares ou dos intestinos podres
ou
se um dia ela acender um corpo baleado
antecipando
a luz materna das estrelas
uma
cidade será uma cidade bela
a
Terra minha única memória.
Acho
que ela passa voando sobre os cisnes
e
cheira a carne em brasa dos campos de extermínio
ela
pode cruzar as mãos de um velho
ou
disparar uma fábrica de enigmas.
Os
poetas são seres inegavelmente invisíveis
mas
a poesia é tão clara como um piano no espaço
eles
se infiltram incógnitos nas multidões raivosas
ela
descreve um arco no céu e reinventa a noite
eles
atravessam portas fechadas de cofres vazios
ela
projeta o sonho do Homem no espectro da luz
(do
livro O inventor de Enigma)
in:
41 Poetas do Rio. Funarte, 1998.
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