Fonte
da imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Lima
CARLOS
LIMA
RJ , 1945
ALMAS
MOFADAS
A
André Breton
A
vida apenas esta
no
picadeiro dos nossos corações destroçados
sob
a cal e os esqueletos dos sonhos impossíveis
A
vida apenas esta
na
usura dessa saudade lusa que me rói
como
as garras de um violino fantasma numa casa deserta
A
vida apenas esta
no
exílio selvagem dos meus olhos perdidos dos teus
na
vertigem do abismo desse céu onde se escreve a palavra nunca
A
vida apenas esta
enquanto
o carnívoro liebestod do destino
afia
as suas facas na garganta azul do tédio
A
vida apenas esta
onde
o espantalho fluvial da dor
acende
o teu nome nas pálpebras da noite vasta
A
vida apenas esta
eu
aqui bebendo genebra só pensando nela
eu
aqui tomando um porre de gim sem pensar em mim
A
vida apenas esta
nesta
melancolia de minotauro encarcerado
no
labirinto desse amar cegamente o amargo amor
A
vida apenas esta
ainda
que nossas almas mofadas nas cicatrizes de sonâmbulos
silogismos
continuem
apenas tateando nesse ossuário dos desejos a terrestre
aventura
lucilante
(1.9.1996)
…
CANÇÃO
DESESPERADA
Dentro
de mí mismo me he perdido,
Chego
de llorar una ilusión...
E.
S. DISCÉPOLO
Como
um cão louco como uma canção desesperada
só
no meio do mundo só no meio da madrugada
sob
o beijo frio da lua somos despejados da ilusão
(toda
saudade é galega e nem toda cerveja é gelada)
tocamos
a fímbria da noite desiludidos e sem perdão
Minha
poesia, diz a ela, que noite e dia
de
amor padeço, sofro, anoiteço
a
esperança não é mais irmã da fantasia
Chego
cedo do dia já vencido
para
dizer esses versos aos teus ouvidos
mas
sei que os dentes do tédio ultimam os seus desígnios
Ah,
a tirania da tua ausência
deixará
as noites obscenamente incompletas
a
poesia será mendiga sem a pureza dos teus mistérios
já
não haverá mais calma no mundo
a
paixão desertará da vida e tudo que amarmos nos fará sofrer
Mas
esta é apenas uma noite vulgar uma simples canção
no
peito de um homem comum num subúrbio qualquer da cidade
e
não é bom nos determos nas tentações desta paisagem
fiquemos
silentes com o cristal da presença só da presença
neste
dédalo o sonho o sonhador a sonhada não se separam
nunca
mais
(25.8.1996)
in:
41 Poetas do Rio. Moacyr Félix (org.) RJ, Funarte, 1998.
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